O choque de gerações é uma realidade quase sempre intensa e algo desconfortável na vida de quase todas as famílias. Não é apenas a questão de idade que nos afasta aos poucos daqueles que um dia foram o nosso porto seguro. E também não é apenas a questão da maturidade que impede a saudável relação quando os nossos filhos chegam à desafiante adolescência. O que realmente dói, são as projeções que fazemos e as desilusões das expectativas idealistas que temos tanto em relação aos pais como aos filhos. É o estado de ignorância que nos incapacita de percebermos porque afinal a lei da atração nos juntou a todos na mesma família.
Não é raro sentirmo-nos deslocados, que não fazemos parte, que não tivemos sorte com a familia que nos calhou. Ralhamos e rogamos pragas ao que nem sempre parece fazer sentido quando apenas precisamos aprender a analisar estas dinâmicas pelos olhos da espiritualidade;
Projeção: A projeção é um mecanismo de defesa no qual os atributos pessoais inaceitáveis ou indesejados são atribuídos a outra pessoa mantendo-se o próprio em negação dos mesmos. A Projeção psicológica ocorre quando culpamos outros do que ainda não aceitamos em nós.
Ilusão: A ilusão é uma confusão dos sentidos que provoca uma distorção da percepção. Na nossa língua, “iludir” significa ter a esperança de algo desejável. É a busca do que gostaríamos que fosse e a não aceitação daquilo que é. E não estamos todos iludidamente à procura do mundo/vida/pessoa/casa/filhos/pais perfeitos? e não serão as nossas dores apenas a constatação de que os outros não são o que gostaríamos?
A viagem da vida obedece a um propósito de evolução que tanto acontece dentro de nós a nível individual como nas dinâmicas da própria família. A lei do karma, a lei da atração e a lei da vibração criam antes de encarnarmos o cenário perfeito para que o projeto individual de evolução possa acontecer. Nesse projeto estão já a família e cada membro da mesma, a cultura, a forma de pensamento, ideologias, crenças, hábitos, circunstâncias diversas que farão parte da história e do que precisamos viver para nos cumprirmos. Na maior parte das vezes ela não será o que gostaríamos mas o nosso trabalho é procurar que lições pessoais o nosso espírito está a fazer com ela.
Tal como na preparação de uma peça de teatro, tudo o que está presente, foi escolhido com um propósito; usar a encarnação presente para fechar e curar os padrões negativos do passado de onde viemos e ter a coragem de abrir novo padrões que definam as experiências que desejamos algures no futuro para onde vamos.
Deste ponto de vista, a geração seguinte (os filhos) traz sempre a responsabilidade e potencial energético de ir mais além do que a geração dos pais foram capazes. A família escolhida é precisamente a que lhe permite rever ou relembrar de onde vem pois antes de abrir um novo padrão, há que fechar o velho em estado de amor e gratidão pelas aprendizagens feitas. E esta é normalmente a parte mais desafiante pois velhas mágoas e ressentimentos podem sem dúvida adiar o processo.
Mas precisamente porque vêm preparados para transcender os velhos padrões, não percebem, durante algum tempo, que também os carregam dentro de si, projetando assim o seu velho passado, nos pais que ainda o estão a viver.
E se a projeção já é um mecanismo violento de rejeição da própria sombra, a idealização ainda torna estas vivências mais complexas pois condiciona-nos a vermo-nos a nós e a esperar dos outros nada menos do que a visão ideal de perfeição. Precisamente porque não entendemos a razão de atraírmos uns pais desafiantes, sofremos com a ideia de que são tudo menos perfeitos. Que “deveriam” estar a comportar-se de forma ideal. Que se fossem ideais e o que gostaríamos que eles fossem, a nossa vida seria tão mais fácil e seríamos tão mais felizes.
Tanto a projeção como a idealização são mecanismos de defesa inconscientes que apenas são usados enquanto a verdade nua e crua não vem ao de cima. Enquanto não nos atrevermos a olhar para nós próprios e a termos a coragem de assumirmos em nós o que até ali projetávamos facilmente nos outros. Até ganharmos a responsabilidade de termos nós mesmos escolhido a família em que estamos. Escolhida não para ser a familia perfeita que queremos mas sim porque JÁ É a família perfeita que precisamos.
Aprender a reconhecer quem é quem é essencial para sabermos como agir de acordo com cada um, que aprendizagens diferentes cada pessoa nos vem propor e como aproveitar a presença de cada um para a nossa própria evolução pessoal.
Do ponto de vista da lei da atração há uma intenção positiva e aprendizagens valiosas que leva a juntar determinados elementos na mesma família. Ou seja, filhos saberão ver nos pais sombras de si mesmos que precisam ser transformadas e pais verão nos filhos novos caminhos e formas de ser, um potencial futuro, normalmente só realizável numa futura encarnação.
Se soubermos reconhecer estas ligações e aprendizagens pelo olho da alma, temos tudo a ganhar, desenvolvemos a compaixão pelos que representam o passado e gratidão pelos que representam o nosso potencial. Pelo olho do ego caímos no julgamento e na infantil projeção e idealização que nos impede de evoluir e nos prende a violentas e dolorosas dinâmicas familiares.
Bem hajam!
Vera Luz
Leia mais sobre o tema aqui:
Imagem de Sasin Tipchai por Pixabay