Caímos tão facilmente na ilusão de que cada momento presente é novo, fresco, é original, cheio de imenso potencial de renovação, renascimento e com cheiro a novo início. Renovamos essa ilusão no nosso aniversário, no fim do ano, quando mudamos de casa ou de país, quando nos casamos ou iniciamos ou terminamos um relacionamento, quando mudamos de emprego, quando voltamos de férias e porque não lembrar que cada dia faz-nos acreditar que é uma nova oportunidade de renascer.
Então porque as mudanças acima citadas, quase nunca reflectem isso?
Porque mudar de ano, leva-nos à maioria das vezes a cair na velha rotina e padrões disfuncionais?
Porque mudar de emprego, leva-nos a viver as mesmas dinâmicas?
Porque fazer anos, é apenas viver um dia mais festivo mas dentro da mesma rotina e rodeados das mesmas pessoas?
Porque mudamos de país, e encontramos os padrões familiares nos novos amigos, vizinhos e chefes?
Porque mudamos de relacionamentos, e acabamos com novas pessoas, assustadoramente idênticas às que largámos?
Porque deixamos de falar com determinada pessoa e nasce um filho que representa a pessoa excluída?
Porque embora a Vida traga o potencial de renovação sim, é um potencial e não um facto. A renovação deve acontecer de dentro para fora, pois de nada serve esperarmos apenas e passivamente que a mudança surja de fora para dentro. Ou seja, se não levamos uma nova energia e visão para a realidade, ela continuará a devolver a velha energia e visão que temos.
A nossa realidade pessoal é como uma peça de teatro, é uma projeção tal como um filme sai da fita para a tela, é co-criada por nós ao longo de séculos, é um reflexo da nossa visão da vida, das nossas crenças, valores, emoções, relações e padrões karmicos e está em permanente manutenção e/ou actualização através da nossa (in)consciência e das nossas escolhas.
Por isso, pessoas, eventos e padrões mantêm-se os mesmos, através das mesmas escolhas, crenças e valores e até mudarmos as nossas escolhas, crenças e valores, a peça que está em cena mantém-se.
Por essa razão a mudança ou escape exterior é uma ilusão pois onde quer que vás, lá será projetada a tua peça de teatro, lá aparecerão os actores, eventos e circunstâncias que correspondem à tua história.
Algures no tempo iremos reconhecer este fenómeno e perceber que o exterior não está lá para ser manipulado ou evitado a nosso belo favor, mas sim para nos conhecermos a nós próprios e tomarmos consciência do que em nós ainda não foi reconhecido.
Lembremos que a nossa história não começou nesta vida e há muito sobre nós que não sabemos e por isso mesmo, o fenómeno da projeção e co-criação da realidade que nos rodeia, serve precisamente para que tenhamos consciência de quem somos, de velhas escolhas, crenças e valores que trazíamos do passado pois só dessa consciência e aceitação os podemos mudar.
Quando retornamos a esse lugar de poder, quando reconhecemos o co-criador e projector em nós, podemos então começar a escrever uma nova peça. Uma peça diferente que represente uma nova consciência, novas emoções, novos desafios e anseios.
A partir do momento em que aceitamos em nós o que o outro representa, o outro torna-se desnecessário e abre espaço livre para que possa co-criar algo diferente e mais actualizado.
Primeiro precisamos amorosamente agradecer aos velhos actores o fantástico papel que representaram e o quanto aprendemos sobre nós mesmos com eles através da peça. Depois deixar que eles escolham fazer parte da nova peça ou serem substituídos por novos actores que irão aparecer para encenar a nova peça.
Tal como nos grandes filmes, mitos e histórias infantis, a dança da dualidade, a superação da luz perante a sombra é a grande mensagem por trás de todas as histórias inspiradoras.
E porquê?
Porque a nossa dualidade interna, a nossa história pessoal, está sempre a passar à frente dos olhos, está sempre a ser constelada pelas pessoas à nossa volta e o nosso grande trabalho é ganharmos consciência disso, é ampliarmos a nossa consciência de nós mesmos, é deixarmos de mudar a história na tela e aprendermos a mudá-la a partir do projector interno que somos..
Bem hajam!
Vera Luz
Imagem de Ferenc Keresi por Pixabay